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Crítica- Dois Papas: Os Conflitos e as Simplicidades de Dois Homens de Deus

  • Autor
  • 1 de jan. de 2020
  • 3 min de leitura

Atualizado: 12 de jan. de 2020


Antony Hopkins e Jonathan Price como papa Francisco e Bento- Variety

NOTA: 8,0

Lançado na Netflix no dia 20 de dezembro, o filme “Dois Papas” dirigido pelo renomado diretor brasileiro Fernando Meirelles ( “Cidade de Deus”), surpreende na simplicidade com que aborda temas profundos. Inspirados na relação real entre o alemão Bento XVI (Joseph Ratinzeger interpretado por Anthony Hopkins) e o argentino Francisco (Jorge Bergoglio, vivido por Jonathan Pryce). A história relata o convívio dos pontífices em um período que compreende desde a eleição de Joseph como papa ocorrida em 2005 – após a morte de João Paulo II – até a sua renúncia em 2013, que abriu as portas para a escolha de Jorge como autoridade máxima da Igreja Católica.


Digo isso porque o filme apresenta, por meio de longos diálogos entre os dois, as diferentes vertentes que ambos representariam dentro da Igreja: Bento, mais ligado a ala conservadora e consequentemente mais tradicional, desde as vestimentas até o ponto de vista ideológico que carrega, e Francisco, defensor de uma instituição mais progressista, em que ao mesmo tempo que resguarda seus dogmas milenares, também precisa mostrar-se disposta a acolher seus fiéis de maneira mais efetiva. E aqui enalteço o excelente trabalho do roteirista Anthony McCarten, que constrói uma conversa que, apesar de direta e sem rodeios, não deixa de ser menos intensa a partir do momento em que ambos mostram que existem pouquíssimos (ou quase nenhum) ponto em comum entre os eles, no que tange aos caminhos que a Igreja tem trilhado .


Além da divergência de opiniões, no longa existem duas cenas específicas que abordam momentos delicados do passado de Bento e Francisco, além da forma como os dois lidam com a culpa. Francisco, que ainda se martiriza pela sua profunda relação com militares durante a ditadura argentina com início em 1976 enquanto era chefe da ordem jesuíta, e que resultou na prisão e tortura de dois de seus companheiros de missão (Franz Jalics e Orlando Yorio), e Bento XVI que, em meio a um diálogo abafado propositalmente, teria confessado que sabia sobre os casos de pedofilia de Marcial Degollado, influente padre mexicano que em 1990, foi acusado de assédio sexual por 9 homens. Na ocasião, a Congregação pela Doutrina de Fé, então dirigida por Joseph, não puniu o padre que só foi denunciado pela igreja em 2010, dois anos após a sua morte.


Entre flashbacks do passado e pequenas referências ao Brasil inseridas ao longo da trama, existem momentos que levam o telespectador a refletir acerca do que é ser um ser humano, com falhas e dificuldades das quais ninguém – nem mesmo a autoridade máxima da Igreja Católica – estão isentos. A ausência da “voz de Deus”, impasse enfrentado por Bento, o chamado de Francisco quando este era um simples jovem que trabalhava em um laboratório químico e que o levou a deixar sua noiva Amália para entrar no seminário e a sua relação com os dois companheiros de missão após o restabelecimento da democracia na Argentina, são alguns dos pontos que indicam as dificuldades de ambos ao longo da trajetória, apresentando-os como pessoas que, como qualquer outra, choram, sorriem, sentem-se solitários e carecem de perdão.


É Importante salientar que o filme todo traça uma linha muito tênue entre o real e o ficcional e é importante que o telespectador que tem interesse em conhecer a história verdadeira, aventure-se pela pesquisa sobre o período abordado no longa, sendo que como sugestão para tal, deixo esta reportagem da Folha escrita por Leonardo Rodrigues que faz uma comparação entre o que é dito nas telas e o que realmente aconteceu. Obviamente, alguns dos diálogos e fatos contados foram modificados, então é importante saber aquilo que é verdade e o que não é antes de sair falando que essas conversas realmente aconteceram, trata-se de uma liberdade poética do roteirista.



Note como todas as roupas são iguais, porque eles são bispos em período de votação - The Hollywood Reportér

Por fim, é um filme leve, não cansativo e, no quesito a representação visual, praticamente fiel aos ritos e cerimônias da Igreja, mesmo em detalhes pequenos como a diferença nas roupas com a qual Bento e Francisco aparecem pela primeira vez a multidão após suas respectivas eleições Inclusive, detalhes: esta é uma palavra que pode resumir a forma como o filme foi construído. Pequenos detalhes que fizeram a diferença e podem, sem nenhuma dúvida, fazer da obra um dos melhores filmes de 2019.


Autora : Tatiane Raquel

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