Crítica- Childish Gambino- 3.15.20- Um Olhar Reflexivo Sobre O Mundo
- Autor
- 5 de abr. de 2020
- 5 min de leitura
Atualizado: 22 de abr. de 2020

NOTA: 9.5
Childish Gambino é um artista que sempre esteve em constante mudança, tanto que se você pegar cada um dos seus álbuns, não vai conseguir perceber uma similaridade entre eles. Isso se deve ao fator do músico sempre buscar trazer uma experiência nova a cada música, seja por meio de uma crítica ao mundo da fama e a solidão da redes sociais (como em Because The Internet) ou seja por um CD Romântico de Jazz e Blues com tema de monstros e apocalipse Zumbis, como no famoso Awaken My Love.

Mas aí chegamos em 3.15.20, o último álbum do cantor e que de fato parece ser uma carta de despedida, regadas de críticas à nossa realidade, com batidas eletrotônicas e ritmos suaves, típicos do Gambino. O nome do álbum em si, já é uma crítica ao seu verdadeiro lançamento dia 15 de março, onde ele disponibilizou o álbum no seu site com uma capa temporária e após algumas horas apagou, mostrando que aquela era uma experiência única e todas as faixas são nomeadas com cronometragem do CD.
O álbum começa com a faixa We Are, na qual as batidas eletrônicas ecoam enquanto o cantor repete a mesma frase We Are (ou nós somos, em português), como se quisesse pôr em nossa cabeça a ideia de que somos iguais, podendo ser tanto no sentido positivo da palavra “Somos todos humanos e devemos nos ajudar” ou no negativo “Somos todos iguais, máquinas do sistema que agem de acordo com o que a sociedade quer”.

Em seguida temos Algorhythm (uma das duas faixas que tem nome), uma música aonde Gambino critica uma sociedade que sempre está conectada, buscando estar acima dos outros e que é controlada pelas mídias. Ao mesmo tempo que a música faz esse ponto, a canção traz batidas alegres e um refrão que nos leva a dançar no ritmo da batida eletrônica industrial, dando um sentido que somos máquinas que reagirão a qualquer comando, desde que este seja agradável.

Após essa canção, nós temos Time, um feat com a cantora Ariana Grande, que traz uma reflexão sobre o sentido do mundo. Durante toda a faixa eles tentam achar esse significado, seja por meio do amor ou do questionamento acerca da natureza ao nosso redor, porque eles estão ficando sem , tudo isso regado a um coro gospel canto em conjunto catando .

Em 12.38 (ou Vibrate) o cantor nos dá uma pausa de toda reflexão e busca nos trazer uma mistura de R&B com Rap, sobre uma “escapada com uma garota”. Mas o que é engraçado nessa faixa, é que ao mesmo tempo em que ele narra essa situação, Gambino também faz várias homenagens a mulheres negras como: a atriz Tracee Elis Ross, as cantoras Sza e Toni Braxton, além da escritora Chaka Khan. Logo após, vem o rapper 21 Savage com um verso sobre abuso policial, causando uma ruptura na estrutura da letra (mas não da música) e que é quase como se o cantor estivesse dizendo “só porque é uma pausa, não significa que vamos deixar de pensar e sermos críticos”.

Seguidamente temos 19.10 (Ou To Be Beautiful), no qual batidas eletrônicas típicas de baladas surgem enquanto ele começa a cantar sobre as dificuldades que os padrões de beleza podem causar as pessoas pretas, pegando desde o conselho de seu pai “sobre como o mundo é frio para gente como eles”, até a crítica de como a mídia e o mundo está tentando capitalizar a beleza negra e tudo isso regado a um refrão dizendo “ser bonito é ser caçado, não posso mudar a verdade, não posso te acostumar com isso”.

A faixa 24.19 (Aka Sweet Thing), para mim, é a mais agradável do álbum em quesito de letra , pois não tem uma mensagem escondida ou uma crítica, é somente uma faixa em que Childish agradece seu antigo amor por tudo o que ela fez, enquanto relembra momentos que passaram juntos e repete a palavra “obrigado” ao longo da canção, quase como se fosse uma oração. Tem vezes em que mesmo que alguma pessoa suma da sua vida, você se lembra dela e a agradece pelos momentos que passaram e é justamente desse sentimento que se trata essa música.

Logo em seguida vem 32.22( Warlods), a faixa que eu considero a mais confusa do álbum. Durante toda a track, o cantor murmura frases sobre violência, agressão e fogo, quase como se quisesse mostrar o nível de loucura que nossa sociedade pode chegar, ao mesmo tempo que um coro apocalíptico o acompanha como em um coro de batalha, regado a batidas eletrônicas intensas e instrumentos africanos.

A 35.31 (Big Foot, Little Foot) é outro exemplo de Letra versus Batida. Enquanto a batida da música é alegre, quase saída de um filme animado da DreamWorks, a letra fala sobre as dificuldades que o artista sofreu no início da carreira, como tráfico, traição e etc. É como se nessa música ele reafirmasse aquilo que abordou na faixa Algorytm, de que a sociedade vai consumir qualquer coisa que seja bonitinha e agradável, mesmo que por trás tenha uma mensagem bruta e real.

Na faixa 39.28 (Why Go The Party), o cantor faz uma reflexão sobre o porquê de irmos para festas, descrevendo-as como comemorações que parecem ser vazias e cujas drogas presentes não passam de viagens curtas e sem sentido. Eu sei que parece uma campanha do PROED, mas o que Childish quer realmente passar com essa mensagem, é que esses momentos que perdemos nesses ambientes poderiam ser usados de tantas outras formas, como passando o tempo ao lado de quem amamos. A música é quase um tributo ao seu pai e dois amigos próximos que morreram ano passado. Desde a perda deles, o cantor passou a questionar muito a questão da mortalidade.
Olha o discurso que ele deu no festival Coachella Sobre o assunto:

Feels Like Summer é a única faixa que saiu antes do lançamento do álbum, fazendo parte do EP Summer Pack e que ganhou um clipe animado regado de celebridades do mundo da música. A canção é síntese da preocupação do músico em relação a diversos assuntos, indo do aquecimento global até inteligência artificial.

A penúltima track do álbum 47.48 (The Violence) é, para mim, uma das mais lindas. É uma canção que fala do constante medo da violência e como ela está sempre ao nosso redor, ao mesmo tempo que o refrão tenta nos acalmar dizendo “para não nos preocuparmos com o amanhã”. A música ilustra o que significa viver atualmente, mostrando que por mais que tentemos ignora-la, a questão da violência ainda continuará lá, porém, a esperança vem no amor, não só pelos outros, mas em por nós mesmos, mensagem que o cantor deixa claro no final da faixa, em um diálogo super fofo e profundo com seu filho.
Terminamos com a faixa 53.49 (Under The Sun), que é basicamente uma carta de despedida aos seus fãs, na qual o cantor reflete sobre a mensagem que quis passar e sobre a toda sua carreira, enquanto o refrão sinaliza o fim dessa jornada “Tem amor em cada momento debaixo do sol,eu fiz o que quis”.

Para finalizar, o 3.15.20 é um álbum perfeito para o momento que estamos vivendo, pois nós faz refletir sobre a sociedade em que estamos vivendo e como sobre como estamos vivendo: Somos apenas robôs obedecendo o sistema? A gente se ama de verdade? Agradecemos as pessoas que passaram e fizeram diferença na nossas vidas? Questionamos a realidade que vivemos? Sinceramente... eu não sei, mas somente fazer esses questionamentos é um avanço.
Além disso, esse CD reflete o que Childish Gambino sempre representou: alguém que usa a música como uma arma de reflexão para a sociedade, mesmo que ela não queira ou prefira ignorar.
Texto por : Marcos Paulo
Revisão: Tatiane Raquel
Comments